Quinta-feira, sete da manhã. Estávamos preparando o espaço para iniciar um workshop em um cliente. Poucos minutos depois chega um líder que, ao dar bom dia e me abraçar, caiu no choro. Exaustão.

Outro dia, pedimos que as pessoas compartilhassem um desafio profissional que estavam enfrentando. Fazia parte da metodologia de trabalho. Em um dos grupos, uma líder dá voz à dor de muitas outras que encontramos por aí: “como cuidar de processos e pessoas, se 70% do meu tempo é ocupado por agendas de reuniões?” Fadiga. Ansiedade. Insegurança. Estresse. 

Esses são apenas dois exemplos que ilustram a sobrecarga emocional que muitas pessoas que ocupam o papel de liderança vêm sentindo. 

De quem é a responsabilidade?

Recentemente, o The Workforce Institute publicou uma pesquisa realizada com 3.400 pessoas, em 10 países diferentes, que trouxe a informação de que 70% dos entrevistados sentem que seus líderes têm mais impacto na sua saúde emocional e bem-estar do que seus médicos, terapeutas e, pasmem: exatamente o mesmo peso que têm seus parceiros e parceiras de vida. Que responsa, hein?

Confesso que li e reli essa pesquisa algumas vezes. Busquei outras matérias e fontes de informação. Foi difícil digerir. Aliás, há algum tempo me sinto incomodada e reflexiva sobre o peso, a responsabilidade e, também, a culpa que as lideranças estão carregando não só nos ombros como diz o ditado, mas também na cabeça, no coração e para além das paredes das empresas, interferindo diretamente nas suas relações sociais e rotinas fora do trabalho.

Vivemos diariamente na Laborama processos de transformação cultural das organizações. Humanizar negócios e lideranças é um pedido e uma expectativa que normalmente os clientes têm quando nos chamam. E, não tem como falar disso sem olhar para saúde mental e bem-estar. Porém, em muitos casos se olha para a responsabilidade da liderança em cuidar desse e de outros tantos temas em relação aos seus liderados. Mas, quem está olhando para saúde emocional pela perspectiva dos próprios líderes?

Criar não só ambientes, como relações saudáveis e seguras é uma via de mão dupla, uma responsabilidade compartilhada. É um processo que começa pela capacidade de cada indivíduo cuidar de si próprio. É o ato de pedir e oferecer ajuda. É responsabilidade tanto de líderes, quanto de liderados, em qualquer que seja sua posição dentro da empresa. 

Estamos incentivando que lideranças tirem suas capas de super-heróis e heroínas ou, ao contrário, estamos oferecendo a vestimenta como uniforme para quem assume esse papel?

A mesma pesquisa revela, timidamente, o que a gente observa na prática: 35% das lideranças entrevistadas dizem estar estressadas, e 42% delas revelam que se sentem assim por causa da pressão que colocam em si mesmas. Em tempos onde dizemos que a vulnerabilidade é rainha, parece que quem ainda comanda as ações é a perfeição.

Tudo vai para a conta da liderança: responsabilidade sobre resultados, performance, estratégia, motivação, engajamento, transformação, desenvolvimento e por aí vai. É claro que quem assume essa posição tem responsabilidades e deveres maiores. Lideranças devem sim ser exemplo mas, será que não estamos pegando pesado demais? Qual é o peso e a medida de cada item dentro da agenda dos líderes? 

Líderes também precisam de direção clara. É preciso entender o que é inegociável dentro desse papel, definir prioridades e entregar para quem está nessa posição alguns pedidos que surgem claramente ou escondidos nas entrelinhas: foco, cuidado e compaixão. 

Percebo uma sobrecarga emocional ainda mais intensa na média liderança. Aquelas pessoas que ocupam a posição do recheio do sanduíche, entende? É quem precisa responder pelas demandas que são orientadas por gerentes e executivos (C-Level), normalmente conectadas com a estratégia do negócio, mas que também dão conta de tudo aquilo que acontece na operação – e a realidade nem sempre chega “lá em cima”, como ouvi outro dia de um cliente. 

E, por falar em não chegar lá em cima, também é importante observar o quanto quem está na posição de C-Level se enxerga de fato como líder de pessoas. Isso passa não só por credenciar e propagar discursos que impulsionam uma cultura mais humanizada, mas especialmente liderar seus diretos de forma equilibrada, orientando para os resultados sem esquecer que esses também são seres humanos. 

É preciso criar um espaço seguro psicologicamente para que essas lideranças assumam que não estão dando conta de tanta pauta, sem medo de serem julgadas. Caso contrário, seguiremos oferecendo, discreta ou descaradamente, a capa de super-heróis e heroínas como uniforme para quem ocupa essa cadeira. 

Uma pausa para respirar

Não quero minimizar o impacto que as lideranças têm sobre colaboradores, nem desconsiderar que sim, existem muitos que estão nessa posição que ainda assumem uma postura tóxica e prejudicial ao desenvolvimento das pessoas e do próprio negócio. Mas, pela minha experiência por aqui, os bons ainda são a maioria.

Desde 2021 oferecemos o Respiro, um projeto que tem como intenção abrir espaço para cuidar da saúde emocional e do bem-estar das pessoas, em especial, das lideranças.

Num ambiente seguro psicologicamente, já vimos mais de 500 líderes se revelarem humanos na nossa frente. Líderes que chegam com o coração apertado, sensíveis à responsabilidade que têm perante tantas pessoas. Que carregam também dentro de si os desafios de ser mãe e pai, de ver pessoas das sua própria família indo embora sem ter o poder de fazer nada. Que se frustram com suas incapacidades e defeitos. Que, na maioria das vezes, têm muito mais consciência das suas sombras do que luzes. Que ali, naquela pausa para respirar, têm a coragem de ser imperfeitos. Porque também são escutados e acolhidos. Porque também se sentem vistos como humanos. 

E é assim, só assim, quando abrimos esses espaços que a humanização da liderança e dos negócios acontece. Afinal, liderar e ser liderado, entre tantas coisas, é também  uma troca e, (re)aprender a se relacionar de gente pra gente, não pode ser tratada como mais uma tarefa.

Escrito por Laila Palazzo Rodrigues, sócia-fundadora da Laborama Cultura Organizacional. 

Laila é certificada em Cultura de Segurança Psicológica pelo Instituto Feliciência, Training da Barrett Values Assessment e Líder Facilitadora de Processos e Grupos formada pelo Programa Germinar. Na faculdade, estudou Comunicação Social e atuou na área de marketing e propaganda por mais de 10 anos, até dar voz à sua intuição e fazer uma transição de carreira, buscando trazer novos significados para os resultados dos negócios. Laila acredita que as organizações são palco para uma grande transformação social e, por isso, trabalha para ajudar lideranças e negócios no seu processo de desenvolvimento. Como facilitadora, já liderou projetos para empresas como Dell, Unimed, Unicred, Sicredi, Sesc, Itaú, Gerdau, Lojas Renner e YouCom, Yara Brasil Fertilizantes e Grupo RBS. 

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